Palestinos e favelados, o inimigo comum: o Estado

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Escrito por Fábio Nogueira, militante da Educafro, historiador e Celso Sanchez professor da Unirio .

 

(Texto escrito em 2014 por Fábio Nogueira é militante da Educafro, Estudante de história da Universidade Castelo Branco e Celso Sanchez professor da Unirio)

Assistir as cenas de violência na Palestina nos deixa profundamente estarrecidos e sem palavras. Quando hospitais e crianças dormindo em uma creche viram alvo, nos damos conta de que a barbárie se impôs à realidade.

Estamos vendo neste momento uma guerra desigual onde milhares de vítimas, em imensa maioria inocentes, pagam pelo preço de disputas por outros interesses. Israel tem a maior potência militar da região do Oriente Médio, a justificativa ao bombardear escolas, abrigos humanitários e prédios residenciais é que, segundo a inteligência de Israel, grupos radicais usariam estas áreas como escudos humanos. Mas perguntamos, mesmo assim bombardeam? Se crianças morrem são meros “danos colaterais”? Assume-se a ética dos fins justificam os meios? Isso é a inteligência da inteligência?

Como se pode notar, a guerra também é pelo domínio da narrativa, da argumentação assassina e cínica que justifica a morte, o sangue, o ódio e a negação da vida.

Até o momento o holocausto palestino vitimou mais de 1.500 pessoas, muitas delas crianças que nesta altura dos acontecimentos o governo de Israel as qualificaria como pequenos terroristas. Para justificar o genocídio, na guerra argumentativa, alguns defendem o estupro de mulheres palestinas… Ou até mesmo a morte das mulheres, como disse esta deputada

Assim como a estratégia nazista do confinamento que segregou a população polonesa no gueto de Varsóvia, a faixa de Gaza é um território intransponível, não se pode entrar nem sair, nem ajuda humanitária

O deboche era outro traço da narrativa nazista, o mesmo “sorrisinho cínico de lado” estava presente na estúpida entrevista cujo representante do estado de Israel chama o Brasil de “anão diplomático” e diz que vexame não é matar crianças dormindo e sim perder de 7×1

É a barbárie se repetindo, a despeito de tantos anos lutando e pedindo: “nunca mais”!

O que falariam Hanna Arendt, Theodor Adorno, Walter Benjamin e Edward Said? Teremos outro tribunal de Nuremberg? Ouviremos depois: “mas estávamos só nos defendendo?”. Parafraseando Eichmann: “só cumpria ordens”, e assim matou-se 6 milhões de judeus…

Não é novidade o silêncio das grandes potências mundiais, aliados do estado de Israel diante das atrocidades. O silêncio é uma narrativa de omissão.

Os Estados Unidos, maior aliado político e militar, a todo o momento vêm fazendo vistas grossas e pequenas e inócuas críticas. Os artistas hollywoodianos engajados em causas nobres, para ficarem bem na foto desempenham o mesmo papel das grandes potencias dominantes: silêncio….

Alguns formadores de opinião quando não podem ajudar pioram a situação. O favorito da direita reacionária, Luiz Felipe Ponde, justificou no seu artigo na Folha de São Paulo, que os acontecimentos na Palestina são mero jogo geopolítico. Na sua imensa vontade de fazer sucesso a qualquer custo, permite-se escrever qualquer absurdo.

As prostitutas dos cabarés da França ocupada pelos nazistas tinham mais dignidade diante da falta de respeito aos mortos, às crianças sobretudo. Impossível não lembrar de Voltaire numa hora dessas: “A civilização não suprime a barbárie, aperfeiçoa-a.”

Pessoas como Pondé são capazes de ver o cisco no olho dos outros, e não ver a trave em seu próprio olho. O Brasil, em termos de violência, também tem um quê de faixa de Gaza.

Os números de homicídios, em particular da juventude negra, são compatíveis a qualquer conflito armado. Por ano são mais de 5.000 mil mortos, 150 por dia e mais de 30 mil a cada década. O perfil é o mesmo há mais de três séculos: homens, jovens e negros.

Assim como acontece na Palestina, um dos principais elementos dessa matança é o braço armado do Estado. Desde sua fundação no século 19 como instituição do Estado, a polícia militar foi planejada para proteger a família real e os mais ricos. O alvo principal era os escravos. Nada mudou em dois séculos no principal aparato político-armado e controlador social do Estado. Sugiro tirar o símbolo deles… dá azar! rs

Morrem muitos jovens negros. Enquanto isso… as nossas direitas, centros e esquerdas se fazem de cegas. Os artistas se fazem de mudos, cegos e surdos (salvo exceções). Para ficarem bem na foto, aderem à campanha de mau gosto: “Somos todos macacos”. Não se manifestam dizendo somos todos Claudia, Juan e DG ou Maria, etc. Algo comum entre os três? Todos mortos pelo Estado e por uma sociedade silenciosa.

As semelhanças são bem parecidas entre os lados em conflito. No entanto, o palestino tem o mundo para condenar o opressor. O favelado além do opressor para massacrá-lo conta com a ajuda de toda a classe dominante que quer vê-los bem longe de suas vistas. E, de quebra, ainda conta com as vozes dos oprimidos contra os próprios irmãos.

É impossível diante da realidade que se impõe duramente, não lembrar da seguinte poesia de Bertold Brecht:

Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei

Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.

O que nos resta neste momento é abrir os olhos e perceber que as lágrimas que escorrem do rosto dos oprimidos do mundo se juntam e desaguam no mesmo oceano, a barbárie.
Contra ela só um caminho: a educação transformadora e crítica, capaz de não permitir a omissão, nem o silêncio diante de qualquer injustiça.

Pela Paz em Gaza. Paz no Rio.

(*) Fábio Nogueira é militante da Educafro, Estudante de história da Universidade Castelo Branco e Celso Sanchez professor da Unirio .

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